sexta-feira, março 28, 2008

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«Foi tudo tão estranho.
Era outra cidade. O vento era frio mas não se sentia. As sombras eram grandes mas vazias. As paredes olhavam-me de modo reprovatorio. O sol encandeava mas não brilhava. O ar puro sufocava. E nós estavamos lá mas já não existiamos. O céu ameaçava cair.
Teria sido mais fácil se não tivesse partido, como me disseste para não fazer. Mas parti. Tudo seria diferente se tivesse ficado.
Estou aqui a escrever-te a carta com a certeza que não a lerás quando a receberes mas apenas daqui a uns meses, anos, quando a saudade apertar demasiado e não conseguires esquecer que um dia existimos.A luz está fraca os meus olhos atraiçoam-me e a mão treme-me. Mas tenho de o fazer. Tenho de te escrever. Por ti, por nós, por tudo o que foi e já morreu. Essencialmente por mim. Penso frequentemente que se tivesse ficado hoje não te estaria a escrever a ti, mas sim a voces. Não. Se tivesse ficado não estaria a escrever carta alguma. Estariamos todos aí. Não. Não aí mas na cidade que deixei para trás e já não existe.
Sei que tinhas razão quando me pediste para não partir porque quando regressasse essa já não seria a minha terra. Não acreditei em ti, aliás acreditei, simplesmente o meu orgulho não me permitia dizer-to. Irónico. Irónico que te escreva agora para dar razão a tudo o que sempre me disseste e eu sempre neguei. Irónico que te escreva agora para me despedir de algo já não existe. Irónico que te peça desculpa apenas a ti.
Faltam-me as palavras para dizer o que sinto.
Quando no mês passado aí fui....falhou-me a respiração. Tal como me havias dito, no dia da minha partida, nada era igual, e no entanto nada mudou. É curioso. É curioso ver que apenas tu sabias que seria assim. Que eu só voltaria naquele dia. E que dia. Queria ter-vos dito que quando me vim embora não foi por não gostar de voces. Não. Eu não gostava era do resto, do que nos rodeava. Precisava crescer, e essas paredes entalavam-me. Tinha de partir. Tinha de escolher entre a minha enorme vontade de largar todo esse mundinho que me prendia ou o meu enorme amor que me fazia voar. Sempre fui má a ver prioridades. Tu sabes. Bem sei que a minha escolha não foi a mais certa, mas não imagino a minha vida de outra maneira. Seria demasiado doloroso imagina-la com voces, nesse mundinho que...me faz tanta falta.
Não sei se me entendes, penso que sim, sempre conseguiste faze-lo. Parece contraditorio tudo o que digo, mas os meus sentimentos atraiçoam os meus pensamentos a cada segundo.Desculpa se não fui capaz de aí ficar o mês passado, num momento em que tanto precisavas de mim, mas a coragem nunca foi o meu forte. Não para o conhecido. Só sei ser corajosa com o desconhecido... lembras?
Acho que já chega. Esta carta não faz qualquer sentido e apenas tu poderás, quem sabe, compreende-la se assim o quiseres.
Um grande beijo (quem me dera poder dizer para voces)para ti, e outro para ela, onde quer que ela esteja.»

"A cidade é diferente agora que partiste.
Lembro-me de um vento que costumava gelar-nos os ossos nas noites em que corriamos dos nossos pais. Lembro-me dumas sombras cheias de cor e de esperança que nos deixavam descansar. Lembro-me de brincarmos e riscarmos paredes que nos sufocavam e nos gritavam para que mudássemos. Lembro-me dum sol que brilhava só porque estavamos juntos. Lembro-me do ar que respiravamos após cada corrida, e que nos sabia tão bem por ser tão puro, tão cheiroso a terra.
Mas a cidade mudou.
O vento não se faz sentir. As sombras estão agora vazias e cinzentas, despidas de sonhos e de esperanças. As paredes já não falam, olham-me antes com ar reprovatorio. O sol encandea-me mas não ilumina o nosso caminho, não brilha, não aquece a minha alma como fazia. O ar continua tão puro, mas por isso mesmo sufoca-me, sufoca-me por me lembrar tudo o que deixei para trás. Nós já não existimos e continuamos lá...hoje já não somos o trio magnifico.
Desculpa.
O céu ameaçou cair no dia em que lá regressei.."

...Antes o tivesse feito...
[texto de 8.10.2005]
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Novo blog: www.gritos-em-silencio.blogspot.com
Não substitui este, são blogs diferentes, por aqui continuarei a divagar, a citar, a comentar, a dizer o que me apetece. No novo começarei a dizer o que me apetece, mas sobre outros temas, sobre realidades, noticias, no novo gritarei.
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Mil beijos*

3 comentários:

bitas disse...

obrigada por este post... há muito tempo que não sentia assim ao ler algo. tinha saudades de te ler assim :)
grande, mas mesmo GRANDE beijinho minha doce Cláu :)

Å®t Øf £övë disse...

Cláu,
Na vida deparamo-nos com muitos caminhos, e algumas encruzilhadas, e nem sempre é facil decidir que caminho seguir. A verdade é que temos sempre que escolher um caminho, e depois de o fazer de nada nos vale olhar para trás. Só mais tarde saberemos se escolhemos o melhor caminho ou não, mas a vida é mesmo assim, e há que saber vivê-la.
Bjs.

Maggie disse...

Muito obrigado pelo teu comentário, vou ter em conta os teus conselhos ;) beijinhos!