Os olhos, cheios de sonhos, presos em memórias intermináveis. Uma alma despida (mas não vazia).
Sentou-se naquela cadeira vermelha como se fosse a primeira vez, o mesmo turbilhão de emoções. Não. Não era o mesmo, nem era a primeira vez. Respirou fundo, deixou aquele ar cortar-lhe a garganta, e baixou a cabeça (como fazia sempre).
Baixou a cabeça como fazia sempre mas, desta vez, não haveria uma mão a levantar-lhe o rosto. Brincou com a colher do café. Bebeu um pouco de água. E começou.
Começou a falar, abriu o coração pela primeira vez na vida e disse tudo o que sentia, ou escondia. Fez as acusações que nunca teve coragem para fazer. E ouviu o que nunca lhe foi dito.
- Prometeste que nunca me deixarias. Que estarias sempre aqui quando precisasse. Prometeste que a chuva não duraria para sempre. Que sempre veria as estrelas. Prometeste que se doesse passaria. Que tudo passaria menos tu. Disseste que não irias sem te despedires. Disseste que o que doi é não ter "uma" mão para apertar. Disseste que o vazio não existe.
Sim. É verdade.
- Mas não estás aqui sentado comigo. E eu preciso. Mas continuo a sentir os pés molhados. E as estrelas há muito que não iluminam o meu caminho. Mas dói todos os dias, cada vez mais. E tu não ficáste aqui. Mas não disseste adeus, não me deste um último beijo, um último adeus, um último olhar. E o que dói é não ter a tua mão por perto. E cá dentro falta-me tudo.
...
- Não me disseste nada do que devias ter dito, e prometeste tudo o que não devias ter prometido.
Disse tudo o que precisavas e prometi tudo o que podia. O vazio não existe em absoluto, apenas quando nos falta algo do que querermos. A mão que queremos apertar não é a única que nos pode consolar. As despedidas acontecem a cada segundo, porque cada momento é o primeiro e o último. Somos nós que permanecemos na dor, a dor é apenas um momento passageiro. É preciso ir atrás das estrelas, somos nós que as queremos. As memórias não são tudo, mas são suficientes para compensar algumas ausências.
- Fazes-me falta.
Tu também. Mais do que a mim, a ti.
As lágrimas corriam. Largou a colher. Bebeu o resto da água. E levantou-se.
Levantou-se, olhou em frente, respirou fundo e foi. Sem mais.
sexta-feira, agosto 15, 2008
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